Minha mãe conta a história de um dia que ela estava na praia com as
amigas. Eu tinha uns dois anos de idade, caminhava entre as cadeiras de praia e
o guarda-sol, conversando com todas as pessoas, na maioria das vezes pedindo
que me dessem “sovete de molango”. Andava com dificuldade na areia, minha mãe
atrás de mim certificando-se de que eu não me perderia na praia. Foi então que
me encostei a uma cadeira me apoiando para não cair. Na cadeira estava sentado
um homem. Este homem era o meu pai, que tinha deixado minha mãe grávida, dois
anos antes. O homem me olhou, e então correu os olhos pela praia. Viu minha
mãe paralisada. Ele olhou novamente pra mim. Meu pai biológico olhando pro
seu próprio filho, pela primeira vez.
O homem virou o rosto como se não conhecesse minha mãe. Imagino
que ele deva ter ficado nervoso. Continuou a conversar com alguém, como se nada
tivesse acontecido.
Eu não preciso ler nenhum livro de psiquiatria pra perceber que
tudo o que faço pelas minhas filhas é uma espécie de compensação de todo o
carinho paternal que eu não tive. Isso não quer dizer que o abandono tem um
lado bom: se eu tivesse um pai carinhoso e presente, tenho certeza de que eu
seria ainda melhor.
Os principais arrependimentos da vida são sobre não ter valorizado
as pessoas mais importantes. “Deveria ter passado mais tempo com as pessoas que
eu amo”; “deveria ter dado menos valor para o dinheiro”; “deveria ter sido mais
presente”; “não deveria ter me preocupado com a opinião dos outros”.
As pessoas dizem que a vida é curta, mas no meu ponto de vista parece que a vida é
longa. Pessoas recomeçam todos os dias. Recomeçam relacionamentos, recomeçam
carreiras profissionais. Descobri pela internet, que até o cara que abandonou
minha mãe tem agora uma família linda. É um pai participativo, finalmente. Fico
feliz que a vida seja longa o suficiente para que essas coisas aconteçam. A vida
é longa e cheia de oportunidades pra você ser uma boa pessoa. Todos os dias
algo esbarra na sua cadeira de praia e te diz que você pode ser uma pessoa
melhor. Talvez hoje, tenha sido este texto.
Por Marcos Piangers, palestrante sobre tecnologia e inovação,
criatividade e paternidade, escritor do livro Best seller O Papai é Pop.